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segunda-feira, 23 de março de 2009

Boletim UNIVESP

Ensino a Distância e o Programa UNIVESP
No dia 10 de fevereiro de 2009 aconteceu uma reunião do Conselho Universitário (CO) que aprovou sem nenhuma discussão ampla com a comunidade universitária o curso a distância em Licenciatura em Ciências. O curso fará parte da iniciativa Universidade Virtual do Estado de São Paulo (UNIVESP), projeto da secretaria de Ensino Superior do Estado de São Paulo que visa atender à demanda por mais vagas no ensino superior público e criar um programa voltado para a formação de professores do Ensino Fundamental e do Ensino Médio. A idéia se baseia no formato do Ensino a Distância (EaD).
As atividades da UNIVESP estão previstas para serem implantadas a partir do primeiro semestre de 2009, através de diferentes módulos que serão descritos a seguir. O programa prevê o desenvolvimento das atividades pedagógicas por via do canal digital da TV Cultura, além de apoio via telefone e via internet. O formato deste primeiro curso de Licenciatura em Ciências prevê apenas metade da carga horária do curso realizada de forma presencial, nos pólos de apoio instalados na universidade. O projeto, a princípio, contará com oito docentes para um total de 360 alunos por ano. Ao final de quatro anos serão 1440, isto significa que cada docente será responsável por 180 alunos.
Discutir a UNIVESP é refletir sobre o Ensino Público do Estado de São Paulo e do Brasil. O projeto não diz respeito apenas ao Ensino Superior, mas apresenta conseqüências para todas as esferas de ensino. Se o projeto, de imediato, se figura como uma tentativa de democratizar o acesso ao Ensino Superior Publico, olhando mais atentamente e aprofundando-se na iniciativa podemos encontrar sérias limitações e a fragilidade e insegurança do programa.
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... A Educação Brasileira
Uma pergunta precedente a este debate é: qual é, e qual deve ser, o papel da Educação Pública no Brasil?
Educar o nosso povo é, antes de tudo, torná-lo protagonista do seu futuro e autor de suas decisões; educar é permitir que a sociedade seja composta por mulheres e homens conscientes de si, a fim de refletir o meio em que se inserem, para que assim possam tomar para si a responsabilidade do futuro coletivo e constantemente transformar a realidade que vivem. Sabemos, porém, que não é dessa maneira que as autoridades publicas tratam a questão, e a história brasileira é marcada pelo aborto dos projetos educacionais de cunho emancipador.
O ensino meramente instrumental, privilegiado em detrimento deste caráter emanciapador, tem como fim a formação de braços e não a formação de mentes. A formação técnica e profissionalizante não pode andar descolada da formação crítica, caso contrário, teremos um país que não é de cidadãs e cidadãos, mas sim uma nação presa à inér cia da alienação.
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+ EaD: ferramenta ou método de ensino?
O EaD é uma ferramenta há muito conhecida d@s brasileir@s. Ao longo da história, serviu para complementar o conhecimento de profissionais nas mais diversas áreas. Porém, é inédito o fato do EaD ser tratado como instrumento chave da formação, deixando de ser uma ferramenta para tornar-se fundamental no método de ensino universitário.
Sem dúvida, o final do século XX tem como marco a crescente influência da internet e dos meios de comunicações virtuais no nosso cotidiano. A comunicação se tornou dinâmica e as distâncias virtualmente encurtaram; a busca por informações é fácil e o conhecimento é capaz de atingir um número maior de pessoas. Mas, se por um lado o EaD facilita no complemento educacional, por outro lado, pensá-lo como eixo central em um método de ensino pode trazer conseqüências desastrosas, estando o Ensino Publico brasileiro em um quadro já desolador.
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+ Alun@s Presentes
Partindo dessa verificação do papel da Educação, afirmamos que a sala de aula deve ser pensada como um ambiente de discussão horizontal, em que professores e professoras cumprem o papel de nos orientar nas possibilidades do aprendizado e de nos trazer perspectivas para nossa atuação, tornandonos agentes do ensino, agentes de sua formulação e prática, dentro e fora da Universidade. E isso se dá, também, no debate em sala de aula, na exposição de nossas dúvidas quando compartilharmos e construímos juntos, alun@s e professores(as).
De outra maneira, a relação pode ser verticalizada, tendo de um lado um(a) emissor(a) e de outro os receptores. Sem que o caminho da construção se dê ao inverso, a informação torna-se unilateral, e nós, alun@s, não participamos da nossa própria formação. A UNIVESP se apresenta à sociedade nesses marcos. São poucos os momentos que a relação alun@-professor(a) se dá de forma bilateral, já que são poucos os canais de diálogo abertos, estando presentes nas poucas aulas presenciais e em fóruns virtuais que não garantem a participação coletiva.
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+ O Ambiente Universitário
Há de se destacar que, para a educação efetiva, há ainda um “conteúdo oculto”, que não está presente nas salas de aula, mas nos corredores, nas conversas com @s colegas de curso, de faculdade; nas conversas com professores e professoras fora de aula; é um conteúdo rico em capacidade de ampliar nosso campo de interesse.
Além disso, o ambiente universitário assegura condições apropriadas para o estudo, para o desenvolvimento da iniciação científica, bem como laboratórios, centros de pesquisa e assistência social. São inúmeros benefícios que a Univesp não apresenta.
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+ E o tripé Ensino, Pesquisa e Extensão, como fica?
As universidades estão balizadas no tripé Ensino, Pesquisa e Extensão, o que quer dizer que devem estar centradas na formacão efetiva em suas muitas competências, na elaboração e produção de conhecimento e no reflexo destes no meio social. Se a qualidade do ensino na UNIVESP é questionável, o que dizer da pesquisa e extensão? Quais são as perspectivas para reverter o conhecimento adquirido à distância em benefícios para a população? Uma Universidade que não cumpre com este papel social está descaracterizada e não apresentar razão de ser.
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O programa da UNIVESP se apropria da metodologia do EaD. Assim, devemos analisar como o ensino à distância está sendo introduzido no Estado de São Paulo.
Em diversos países o EaD tem sido adotado como uma ferramenta adicional ao ensino. Ou seja, ele á usado em situações extraordinárias nas quais algumas pessoas não têm como serem atendidas pelo ensino presencial, como detentos ou pessoas impossibilitados de locomoção, etc. No entanto, a Univesp tem como caráter substituir o ensino presencial, nesse caso, na formação do professor. De acordo com a Secretária de Ensino Superior, a implementação do programa se dará em três módulos a partir do primeiro semestre de 2009.
Primeiro módulo: “tem como foco a formação de professores em exercício nas redes pública e privada do estado. Nele está previsto a oferta de um curso de Licenciatura em Pedagogia e um curso de Licenciatura em Ciências, desenvolvidos a partir de experiências de sucesso realizadas na USP e na UNESP. O principal objetivo destas ofertas é promover a melhoria da educação no ensino infantil e no fundamental de 1a a 4a séries. Como mencionado anteriormente, isso representa um público-alvo de aproximadamente 35 mil professores”.
Segundo módulo: “contempla a oferta de vários cursos de licenciatura como Matemática, Física, Química, Biologia e Língua Portuguesa. Também para o oferecimento destes módulos serão incorporadas experiências, já testadas, de sucesso de nossas universidades estaduais paulistas”.
Terceiro módulo: “oferecerá cursos de capacitação, extensão, especialização e outras formas de educação para professores que já tenham um curso superior completo e que desejam seu aperfeiçoamento profissional. Estão programados, por exemplo, dois cursos de especialização: Especialização em Docência no Ensino Fundamental e Médio e Especialização em Gestão Escolar”.
Estudando o projeto com maior atenção, percebemos que se de início a EaD poderia atrair pessoas já formadas pelo ensino presencial, posteriormente, com uma reflexão mais profunda, observamos que a EaD não acaba com o problema da falta de estímulo presente em muitos professores da rede pública de educação. E que pior, se a EaD pode ser uma experiência positiva em alguns casos específicos, a experiência torna-se desastrosa quando usada como ferramenta essencial para formar professores com graves deficiências na formação. A ADUSP (Associação de Docentes da USP) afirma que o esse projeto poderá afetar duas gerações, a dos professores formados pelo programa e a dos alunos formados “pelos professores formados à distância”.
Além disso, o desenvolvimento da capacidade “prática” de ensinar não é a única dimensão da formação de um profissional da educação. “Este modelo, desenvolvido à distância através de mídias interativas e novas tecnologias da informação e comunicação, se organiza em projetos de cursos que partem do trabalho dos professores, exclusivamente em sua dimensão prática, reduzindo as possibilidades da mediação pedagógica necessária no processo de ensino, e não se sustenta quando confrontado com as condições de produção da vida material e da organização da escola e da educação, que demandam outras habilidades, capacidades e competências de seus educadores” (COSTA LOPES DE FREITAS, Helena, 2007).
Fonte: http://www.ensinosuperior.sp.gov.br/portal.php/univesp
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+ Quem educará @s brasileir@s de amanhã?
De inicio, a UNIVESP atuará na formação de professores e professoras que atuarão na rede básica de ensino. Esta fase da vida educacional das crianças é fundamental para o desenvolvimento futuro da sociedade. E é esta fase fundamental do ensino que sofre hoje com o descaso das autoridades publicas; escolas em péssimas condições e sem investimento publico, profissionais mal remunerados, salas lotadas.
Então, é nosso papel, quando se trata de discutir a UNIVESP e a qualidade do ensino que a iniciativa trará, questionar a quem o projeto vai formar para educar o país de amanhã.
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+ Financiamento
Não é a toa que o projeto da Univesp tem sido apresentando como uma salvação pelo governo estadual. A medida procura incluir mais estudantes nas estaduais públicas abaixo do custo normal de um estudante presencial. Estima-se que cada aluno custará aos cofres públicos apenas 3.000 reais durante toda a duração do curso, medida interessante para o Estado na atual situação de crise, em que áreas sociais centrais, como a educação, sofrem corte de verbas.
De acordo com a ADUSP, as despesas (incluindo as da União e do Estado em todas as instituições de ensino superior) não superam 0,3% do PIB paulista; comparando com os níveis de investimento no âmbito internacional esse percentual deveria ser superior a 1%. O programa é uma “solução” fácil e barata para uma falsa democratização do ensino superior público. O governo vende uma melhora na educação enquanto o acesso à educação pública de qualidade continua restrito. Não podemos deixar de traçar um paralelo, nesse caso, com outras iniciativas, como o aumento dos cursos pagos e o Pró-Uni.
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+ Alternativa ou desvio ao ACESSO?
Qual parcela da sociedade está hoje nas universidades federais e estaduais? Quem ocupa as salas de aula da rede publica de ensino superior? A educação básica relega a maior fração da sociedade, em todo o país, a péssimas condições de ensino que acabam, como conseqüência, por afastar essa maioria do Ensino Superior Público e de Qualidade. Democratizar o acesso é permitir que esse imenso setor social seja capaz de criar condições que lhe permitam a inserção no desenvolvimento, de transformar o que é hoje desigualdade e injustiça em igualdade e democracia.
A ampliação de vagas nas Universidades Públicas de maneira virtual vem se revestindo de um discurso democrático, enquanto uma alternativa ao acesso, quando se configura, antes, como um desvio, uma maneira de remediar um problemático quadro social, abrindo as portas do fundo ao Ensino Superior.

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